quinta-feira, 17 de março de 2011

Minha vida de camelô 1



Existem fases na vida da gente em que você necessita fazer algumas adaptações. O pior é que surgem situações repentinas que se você não for rápido......dança!!!!

Por uma destas tristes circunstâncias da vida e o falecimento de minha mãe quando eu ainda era uma criança, muitas coisas mudaram  de repente na vida da família. Fizemos um caminho inverso...de uma vida boa de classe média alta...para uma vida simples de pobre.....porem" digna e honrada", como diria meu ex aluno e hoje amigo, Lúcio Bocão!

Assim, por uns tempos, o colégio particular virou escola pública, o carro virou busão, o bairro gutierrez virou centrão e por aí vai. Foi assim que com onze anos tive que aprender a me virar sozinho.

 Meu avô tinha um sítio com muitas arvores frutíferas e ele mandava sempre as frutas da época para nós.

Certa vez, numa época de mexerica, toda semana chegava um saco de 60 kilos da fruta lá em casa. E tome mexerica no café da manhã, no almoço, na merenda da escola, no jantar e por aí vai. Era só o saco começar a esvaziar e tome mais 60 kilos da fruta. Eu era o irmão mais velho dos cinco e geralmente, naquela época, o irmão mais velho tem que ser o exemplo para os mais novos. Eu não podia nem pensar em não comer a porra da mexerica se não a "Iapa"  comia no lombo.

A cada saco que chegava era um "puta que pariu!!!!.....mais mexerica!!!!" A gente não aguentava mais. Certo dia, observando a feirinha na porta de nossa casa, pensei em pegar as mexericas e vender. Pedi uma caixa de papelão vazia a um feirante, pus os 60 kilos na porta de casa e vendi. Vendi tudo, até os vizinhos compraram, e ganhei minha primeira grana. Este foi meu primeiro negócio. Agora já estava esperando a próxima remessa com ansiedade de vender. Claro que meu pai não podia saber, filho dele, naquela época só podia pensar em estudar, nada de trabalho!

Mas, a vida é ingrata e injusta em certos aspectos. Meu pai chegou em casa depois do trabalho, foi procurar a fruta e achou uma quantidade mínima!...

-Uai..cadê as mexericas?
-Uê pai....... nos chupamos!!!!!
-Todas????
-É!!!!!
-Não minta!!!!!
- Que isto pai!!!!! (claro que os irmãos estavam todos no bolso).

Como era de praxe, ele me chamou para irmos na padaria comprar pão. Aí aconteceu o que nunca tinha acontecido antes, no caminho encontramos com dona Ana, vizinha faladeira que tinha, dentre outros atributos, a mania de tomar conta da vida alheia. Era tudo que eu não queria e não precisava naquele momento.

- Oi seu Antonio...como vai a vida...
- Vamos levando né dona Ana...Vamos levando!!!
- Ai ela soltou....que gracinha seu filho hoje né!!!
- Eu olhando para ela com aquele olhar de " não dona Ana, pelo amor de deus não!!!
- Como assim perguntou meu pai!
- Ora seu Antonio, ele vendeu as mexericas todas e disse que era para ajudar o pai!!! Que filho maravilhoso o senhor tem!
- Ah vendeu?????
- Sim...eu até comprei algumas não foi julinho?
- Eu olhando para ela e pensando " foi sim sua vaca velha, dedo duro, filha da puta.....Você acabou de me fuder...."
_ Aliás já chupei algumas e são muito boas...quando chegar mais me avise tá!
- Em pensamento......" vou avisar sim sua côrna,!!!"
- Tchau gracinha...disse ela apertando minha boceja!!!!
- Eu em pensamento..." vá tomar no oidoseucú...vaca velha!

O silencio de meu pai e meu, durante o resto de nosso caminho já antecipava o que iria acontecer. A Iapa comeu solta em todo mundo, não pela venda das frutas em sí, mas pela mentira. A partir de então secaram as mexericas e as demais frutas enviadas por meu avô e ainda por cima toda vez que a família se encontrava olhares e comentários das minhas tias eram " que menino ruim este, vendendo as frutas que o avô manda!!!!". Mas foi assim que começou minha vida de camelô, que gerou outras histórias, inclusive a do meu irmão gêmeo que existiu durante um tempo, mas que eu nunca tive!

Só para esclarecer, a Iapa, era um instrumento de correção usado várias vezes por meu pai. Era um chicotinho com cabo de madeira e uma lingua de couro, que ele usava para o acerto de contas. O pior da Iapa é que ela ficava em cima do guarda roupas e todas as vezes que ia ser usada, a vítima é que ia busca-la. Assim o torturado buscava o instrumento de tortura que ia ser utilizado contra ele mesmo e entregava para o torturador!

Certíssimo o ditado que diz " A mentira tem perna curta", principalmente quando tem uma dona Ana pelo caminho, que por mim, está queimando no mármore do inferno até hoje!



Um comentário:

  1. Muito bom o texto Júlio! Parabéns pelo blog!
    Quando tiver um tempo contas as histórias dos tempos de DJ.

    Aquele abraço

    Charlinho

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